quarta-feira, 9 de novembro de 2011

Sem chances de abortar a missão

Uma equipe de astronautas completou nesta semana uma experiência que simulou uma viagem de ida e volta ao planeta Marte. Um grupo de seis homens de diferentes partes do mundo ficou confinado numa “nave espacial” localizada num prédio em Moscou desde o dia 3 de junho de 2010. O objetivo do projeto era fazer uma simulação de uma missão a Marte da forma mais próxima possível da realidade. Os astronautas, por exemplo, só podiam tomar banho uma vez por semana, se “comunicar” com o planeta Terra respeitando o tempo real que levaria para uma mensagem de verdade ir da Terra até Marte, etc. A ideia da experiência era avaliar a resposta do grupo às condições psicológicas que uma tripulação real teria que suportar, como por exemplo, o espaço reduzido da nave e a falta de contato com o mundo exterior por tanto tempo. Desta vez, a equipe obteve êxito após alcançar mais de 500 dias de confinamento. Na primeira tentativa, a missão foi abortada no centésimo quinto dia, pois um dos tripulantes tentou beijar uma astronauta a força e outros dois quase saíram no tapa.


Fiquei imaginando se tivéssemos a chance de experimentar certas situações da nossa vida antes de encararmos as mesmas de fato. Seríamos, quem sabe, colocados numa espécie de cápsula em que todas as emoções seriam previamente simuladas e, assim, teríamos a chance de aprender a lidar com as adversidades da vida, saber se suportaríamos as consequências de certas escolhas, testar as mais diversas possibilidades de se resolver um problema, sempre podendo voltar atrás pra tentar outro caminho, outra solução menos danosa. Escolher uma carreira que nos levasse ao sucesso e à plena satisfação profissional, podendo vivenciar suas vantagens e desvantagens. Encontrar a pessoa certa, o amor da sua vida, testando  por quanto tempo vocês seriam capazes de suportar seus defeitos e suas idiossincrasias, por exemplo. Muitos de nossos momentos difíceis, muitas de nossas crises, de nossas preocupações poderiam ser evitadas. Poderíamos tomar a decisão sempre mais acertada, aquela que nos causasse os menores desgastes, etc. Ao fim de tudo, teríamos talvez o certificado de aptidão para o cumprimento de nossa missão da forma mais brilhante possível.

Mas como diz a canção do Caetano, “a vida é real e de viés” e não tem essa de poder simular, experimentar antes, fazer test-drive. Porque a vida não tem roteiros. A nós é vetada a chance de ensaios prévios. A vida real não permite playback, não há como rebobinar a fita, apagar e regravar por cima. É ao vivo, sempre. Não tem garantias nem rígidas cláusulas contratuais de proteção ao consumidor. Não temos, de fato, o controle de todas as condições externas. Muitas vezes, podemos dar conta apenas das nossas atitudes. E olhe lá. Viver é sempre pra valer, é sempre à vera. É como jogar-se de um trapézio, esperando que alguém te segure do outro lado, é como andar na corda bamba, nem sempre contando com a proteção de uma rede pra amortecer a queda. É, enfim, um exercício diário de equilíbrio e confiança em si próprio e nos outros. E, sinceramente, vida programada, previamente ensaiada, não teria a menor graça, seria insossa e tediosa.

Na vida real não existem simuladores nem cápsulas que deem jeito. Pois que viver se aprende, vivendo. E é aí que se esconde a tal beleza da vida. No desafio diário de manter-se equilibrado, apesar dos percalços e adversidades do caminho. É essa falta de linearidade e de certezas que acaba dando sentido a nossa existência e que torna a vida tão interessante a todo momento. Até que se prove o contrário, só temos essa vida para obtermos êxito na empreitada. Portanto, não há chances de abortar a missão.  Só temos uma única opção: fazê-la dar certo!  E sem essa de parar o mundo, que eu que quero descer.

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